XXXIV DOMINGO TEMPO COMUM – ANO A
Solenidade de Cristo Rei
22 novembro 2020
AS LEITURAS DO DIA
Ez 34, 11-12.15-17: Hei-de fazer justiça entre ovelhas e ovelhas.
Salmo 22: O Senhor é meu pastor, nada me faltará.
1Cor 15, 20-26.28: Entregará o reino a Deus Pai.
Evangelho Mt 25, 31-46: Sentar-se-á no seu trono glorioso.
A PALAVRA É MEDITADA
Quando se lê o texto precioso de Mateus sobre o ‘juízo universal', ou cruzamos o olhar com uma das suas imponentes representações artísticas visitadas ao vivo ou reproduzidas em fotografia, nasce espontânea a pergunta, mais ou menos camuflada no segredo da nossa consciência: e eu, de que parte estarei?
Um tribunal tão solene pode de verdade assustar... se o olharmos da parte errada: a do amanhã!
A verdadeira pergunta que Jesus nos coloca, de facto, não se refere ao lugar em que nos encontraremos no dia em que a morte nos colocar diante Dele, Rei e Pastor do rebanho. De facto, naquele momento a questão refere-se apenas a Ele: será Ele a indicar-nos de que lado estar. Mas o fará simplesmente constatando... onde estamos agora!
Esta é a questão mais séria, aquela que conta verdadeiramente: de que parte estou hoje? Onde é que escolho morar? Com quem caminho na minha vida de todos os dias?
Se nos deixamos estrangular pelo medo de ser varridos no último dia e lançados no fogo eterno, poderemos ao máximo comprometer-nos a colecionar alguma obra boa a mais para nos apresentarmos com um curriculum de ‘pontos paraíso' mais consistente. O que parece não interesse muito ao Juiz supremo. Aliás Ele é muito sensível aos nossos lugares que frequentamos normalmente e às amizades que decidimos cultivar na nossa existência terrena.
É hoje que se cumpre o juízo. Na escolha de que lado estar – isto é estar do lado – daqueles que o Rei e Pastor prefere frequentar, na confusão do seu rebanho que é a Igreja.
Para nos favorecer, precisamente Ele, o Rei do Universo, o Pastor supremo, escolheu descer e estar ao nosso lado, metendo-se em movimento para que o seu rebanho não só encontrasse o caminho a percorrer, mas escolhesse também fazê-lo. por isso, nos amou! É o amor a Lei do Reino. Por amor e com amor somos e seremos julgados.
Assim poderia acontecer que nos dêmos conta também nós, hoje, no meio deste rebanho que estamos como ovelhas bem gordas e seguros de nós próprios, ou então coxas e doentias pelas travessias da vida. Num e no outro caso Ele nos toma ao seu cuidado. Algumas vezes acontece-nos tentar escapar do rebanho, e procurar outras pastagens. Ali, como ovelhas perdidas, vem-nos procurar o Pastor bom, para nos trazer de volta a casa.
Mas sucede também agarrar e recusar não só o convite, mas também o cuidado de nos procurar, querendo-nos afirmar na nossa autonomia e independência. Assim o Rei escolhe uma estratégia nova, Ele que não se rende apenas para fazer transbordar em todos os seu amor. E assim o guia e chefe do rebanho torna-se Cordeiro, pedindo humildemente para se fazer transportar aos ombros, Ele que sobre os seus ombros muitas vezes carregou os nossos pesos e as nossas vergonhas.
O Cordeiro inocente torna-se próximo a tal ponto de se revelar Ele tão indefeso e inerme que se despoja de toda a nossa presunção e competitividade. Não há nada a temer diante do Amor! Não há ninguém de quem fugir, se a abeirar-nos é a ternura tenaz de um Filho feito carne... por fim carne de matadouro, por nós e no nosso lugar!
O Amor é perturbador na sua desarmante fragilidade. Fica-nos então só reconhecê-lo, presente e vivo na carne ferida dos nossos irmãos pobres. Os últimos e deserdados são a Sua presença entre nós. Aproximar-nos deles é cumprir um passo decisivo para nos encontrarmos abraçados e apoiados, novamente dentro do rebanho. Não um rebanho de perfeitos, mas uma multidão de necessitados, mendigos de amor.
É assim que nos preparamos para o julgamento. Estranho tribunal, aquele que no trono vê sentado um Cordeiro imolado. Estranho reino, aquele que sobre o trono vê erguer-se um Servo cingido de avental. E, contudo, é precisamente ali, que o nosso coração incerto pode deixar de correr à direita e à esquerda, gastando-se por conquistar um lugar melhor e mais honrado. Ali de facto, deixamo-nos levar, e deixamos até de ter medo de nós mesmos...
Poderemos alguma vez conquistar a inocência? E, no entanto, Ele entregou-a por nós. Escolher estar junto dos mal andados e excluídos é aceitar o dom de se sentir envolvidos grátis pelo Amor. Quem sabe que assim Ele não volte verdadeiramente a reinar no íntimo do nosso coração.
A PALAVRA É REZADA
Jesus, tu fazes-te nosso.
Atrais-nos para ti presente,
presente de forma misteriosa.
Tu estás presente, como o singular
peregrino de Emaús,
que alcança, aproxima,
acompanha, ensina,
e conforta os desconsolados viajantes
na tarde das esperanças perdidas.
Tu estás presente no silêncio
e na passividade
dos sinais sacramentais,
quase que tu queiras vigiar juntamente
e tudo desvelar de ti,
de modo que
só quem acredita compreenda,
e só quem ama
possa verdadeiramente receber.
Ámen
(In Qumran, e La Chiesa: tradução livre de fr. José Augusto)